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Educação


Representações multimodais no ensino de química: concepções, desafios e transformações
Multimodal representations in chemistry teaching: conceptions, challenges and transformations

Emerich SousaI,*; João PaivaII

I Colégio de Aplicação, Universidade Federal de Viçosa, 36570-900 Viçosa - MG, Brasil
II Centro de Investigação em Química da Universidade do Porto (CIQUP), Unidade de Ensino das Ciências, Departamento de Química e Bioquímica, Faculdade de Ciências da Universidade do Porto, Universidade do Porto, 4169-007 Porto, Portugal

Recebido: 10/04/2025;
aceito: 08/09/2025;
publicado online: 06/10/2025

Endereço para correspondência

*e-mail: emerich.sousa@ufv.br

Editor Associado responsável pelo artigo: Nyuara A. S. Mesquita

RESUMO

The study analyzes the initial conceptions and transformations in the use of multimodal representations by future Chemistry teachers after a formative intervention. The study took place in a workshop with nine Master's students in Physics and Chemistry Teaching at a Portuguese public university. Data collection included a pre-intervention questionnaire and a post-intervention activity in which participants suggested multimodal representations. Thematic analysis was used for qualitative data. The questionnaire results showed that, despite recognizing the potential of multimodal representations, participants had conceptual and practical gaps in using them. The thematic analysis identified two central dimensions: personal and conceptual. In the personal dimension, the highlights were the lack of teaching experience, the lack of experience with multimodality, and the view of its use as digital technology. In the conceptual dimension, confusion between multirepresentations and multimodality was observed. In the post-intervention activity, participants demonstrated a change in how they understood and used multimodal representations, incorporating concrete, symbolic, and gestural modes. The results highlight the need for deeper teacher training in multimodals. As the intervention was specific, courses should provide future teachers with opportunities to experience multimodal use in real teaching contexts, ensuring better preparation for their practical application in chemistry education.

Palavras-chave: chemistry teaching; multimodal representation; teacher training; thematic analysis.

INTRODUÇÃO

O ensino e a aprendizagem da química são desafiadores para professores e estudantes, pois essa ciência lida com conceitos abstratos, estabelece conexões entre teoria e prática e entre o mundo visível e o submicroscópico, transita entre representações bidimensionais e tridimensionais e exige que representações estáticas sejam compreendidas em sua forma dinâmica.

A química é um campo altamente técnico que depende amplamente de formalismos simbólicos e visuais. Isto aumenta as exigências para os estudantes de química.1 A missão dos professores, no campo do ensino, apesar dessa abstração latente, é tentar tornar simples o que é, de fato, complexo.

É essencial desenvolver estratégias de ensino que tornem a química mais vívida e tangível.2 Apesar dessas dificuldades, muitos estudantes conseguem ter sucesso na disciplina, coordenando, desenvolvendo e compreendendo ideias, além de aprimorar sua fluência na linguagem científica em um ciclo virtuoso.3 Aos poucos, os estudantes que estão iniciando o estudo da química vão se apropriando da linguagem e das particularidades dessa ciência, percorrendo um caminho que pode levá-los à fluência representacional e à compreensão dos conceitos e relações.1

Este artigo tem como objetivo analisar as concepções iniciais e as transformações no uso das representações multimodais por futuros professores de Química, após uma intervenção formativa. Este artigo está organizado da seguinte forma: nas próximas seções discutem-se o triângulo de Johnstone e os conceitos de multirrepresentações e multimodalidade no ensino de Química. Em seguida, são apresentados os procedimentos metodológicos da pesquisa. A seção de Resultados e Discussão explora as respostas dos participantes à luz da literatura. Por fim, apresentam-se as conclusões e implicações para a formação de professores de Química.

 

O TRIÂNGULO DE JOHNSTONE

Johnstone,4 preocupado com a sobrecarga que pode ocorrer nos estágios iniciais da aprendizagem da química - em que os alunos são confrontados com a introdução simultânea de substâncias desconhecidas na bancada, uma descrição delas em termos moleculares e uma representação por símbolos e fórmulas - abordou a questão da aprendizagem em múltiplos níveis que ocorre na química e utilizou a figura de um triângulo (Figura 1). Assim, os três níveis de representação da natureza da química, são: o macro e o tangível, o que pode ser visto, tocado e cheirado; o submicro, com átomos, moléculas, íons e estruturas; e o representacional, com símbolos, fórmulas, equações, molaridade, manipulação matemática e gráficos. Cada vértice mostra uma abordagem 100% daquele nível e os lados mostram uma transição de um nível para o outro, dependendo da ênfase dada (mais macro e menos representacional, por exemplo). Em muitas lições há uma mistura de todas as três experiências simultaneamente, representadas por um ponto dentro do triângulo, sua posição sendo determinada pela proporção relativa dos três componentes.4

 

 

Johnstone argumentou que, nos estágios iniciais do aprendizado de química, o jovem aprendiz não pode trabalhar em todos os três níveis ao mesmo tempo. Como professores, precisamos nos concentrar em um nível de cada vez, até que os alunos estejam seguros em sua compreensão.5

 

MULTIRREPRESENTAÇÕES E MULTIMODOS

A ciência envolve a construção de representações externas, como linguagem, diagramas e equações, e representações internas, formadas por operações mentais.6 No presente estudo, o termo "representação" será utilizado exclusivamente para se referir às representações externas.

No contexto do ensino de Ciências, é importante distinguir entre os termos "representações múltiplas" e "representações com multimodos". As "representações múltiplas" referem-se à prática de apresentar um mesmo conceito científico por meio de diferentes formas, permitindo aos alunos exposições repetidas ao mesmo conteúdo, ainda que recorram aos mesmos sistemas semióticos, como linguagem oral e escrita, imagens, gestos, símbolos científicos e objetos concretos. Já a "representação com multimodos" diz respeito à integração, no discurso científico, de diferentes modos de representação para expressar o raciocínio e os resultados científicos.7 Assim, a representação com multimodos enfatiza a articulação simultânea de diferentes modos em um mesmo ato comunicativo. Quando um professor ensina hidrocarbonetos na química orgânica utilizando a fórmula estrutural plana, a fórmula estrutural condensada e a fórmula em linha de ligação, está empregando múltiplas representações, todas dentro do modo simbólico. Quando um professor explica sobre hidrocarbonetos e utiliza fórmulas estruturais e também kits moleculares, está combinando modos distintos - o simbólico e o concreto - para enfatizar a tridimensionalidade das moléculas e a diferença entre suas representações bidimensionais e espaciais. O uso de múltiplas representações permite flexibilidade na forma como as informações são distribuídas entre diferentes representações, afetando tanto a complexidade de cada uma quanto o grau de redundância entre elas, e está associado a três funções principais: complementação, restrição e construção.8 Os alunos devem usar e entender múltiplas representações e também devem se mover fluentemente entre múltiplas representações e modos de representação para desenvolver a compreensão conceitual e a capacidade de explicar conceitos no nível submicroscópico,9 mas os alunos têm que aprender conteúdos que não compreendem usando representações que também não dominam.10 O desenvolvimento dos estudantes é influenciado pela maneira como esses alunos usam as múltiplas representações e a movimentação através dos níveis de Johnstone.11

Cada sistema de representações tem suas próprias convenções de significação e funcionamento. Para que um sistema semiótico possa ser um registro de representação, deve permitir as três atividades cognitivas fundamentais ligadas a semiose: a formação de uma representação identificável, o seu tratamento e a sua conversão (Quadro 1).12

 

 

A conversão desempenha um papel essencial na conceitualização e, muitas vezes, tal fato é negligencido.12 Sob a orientação do professor, os jovens aprendizes devem ser treinados para traduzir ou fazer mudanças semióticas de uma forma para outra.13

Multimodalidade é a designação para definir a combinação dos diferentes modos semióticos na construção do artefato ou evento comunicativo.14 Uma representação é considerada multimodal se compreende mais de um modo e requer a integração dos significados por trás desses modos pelos alunos.15 A perspectiva multimodal reconhece que várias formas de modos semióticos trabalham juntas para criar significado em um ambiente particular.2 Modo é definido como um sistema de recursos de criação de significado que é moldado e desenvolvido ao longo do tempo em uma comunidade.16

Os modos podem ser o quadro de giz, a tela de projeção, o modelo bola-vareta, a proxêmica, a fala, o gesto17 ou podem ser agrupados em categorias: descritivas (verbal, gráfica, tabular, diagramática, matemática), figurativas (pictórica, analógica ou metafórica), cinestésicas ou de gestos corporais (encenação, jogos), que usam objetos tridimensionais (3D) ou maquetes, experimentos.18 Para efeitos de caracterização dos modos, o presente trabalho utilizará os cinco modos de representação de modelos científicos apresentados por Gibert:19

(i) O modo verbal refere-se à comunicação baseada na linguagem, podendo ocorrer na forma falada ou escrita.

(ii) O modo simbólico refere-se à comunicação baseada em notações formais e convenções, incluindo símbolos e fórmulas químicas, equações químicas e expressões matemáticas, especialmente equações.

(iii) O modo visual refere-se à comunicação baseada em imagens e elementos gráficos, abrangendo gráficos, diagramas, animações, representações bidimensionais de estruturas químicas ("diagramas") e "modelos virtuais" gerados por programas de computador.

(iv) O modo concreto (ou material) refere-se à comunicação baseada na manipulação de objetos físicos. É tridimensional e utiliza materiais resistentes.

(v) O modo gestual refere-se à comunicação baseada no movimento corporal e no uso de gestos, envolvendo o corpo ou partes dele para representar conceitos.

A Figura 2 ilustra como o conceito de densidade pode ser representado por meio dos cinco modos propostos por John J. Gilbert: verbal, simbólico, visual, concreto e gestual.

 

 

A comunicação na sala de aula é essencialmente multimodal,17,20,21 assim como também o é o discurso científico,21 e a interação de todos os modos em uso pelo professor potencializa a construção de significados em sala de aula.22 Os conteúdos de modos diferentes são complementares, o que significa que o contributo dos dois sistemas expressa mais do que cada um dos sistemas semióticos considerados isoladamente.14 Falhas de comunicação acontecem dentro de sala de aula e daí a importância de oportunizar diferentes modos de comunicação para compensar eventuais equívocos.18

Diversos estudos abordaram o uso de multimodos no ensino de Química. Essa abordagem melhora a interpretação de representações químicas e aumenta o engajamento interpessoal e cognitivo.23 A análise de textos escritos e desenhados pode auxiliar na compreensão do conteúdo e no desenvolvimento da alfabetização disciplinar.24 A dependência excessiva de representações simbólicas e a falta de integração de múltiplos modos podem prejudicar a compreensão conceitual dos estudantes25 e mesmo com a inclusão de gestos e elementos visuais, a comunicação em sala de aula pode permanecer unidirecional.26 No ensino de Química, é essencial atividades experimentais ou manipulação de algo concreto para trabalhar no nível macroscópico e explorar o nível submicroscópico com recursos visuais e modelos.27

Daí a importância de fornecer oportunidades de desenvolvimento profissional para professores para ajudá-los a entender e implementar estratégias instrucionais que integrem múltiplas representações de conceitos químicos.25 Sem entender quais desafios de integração de diferentes modos os alunos enfrentam, os professores não podem elaborar estratégias apropriadas para ajudar os alunos a resolver esses desafios.15 Compreender o papel desempenhado pelos vários modos permite ao professor fazer escolhas dos modos que julga mais apropriados para serem utilizados no ensino de um determinado conteúdo.17 É importante incorporar nas discussões, promovidas nesses processos formativos, as funções comunicativas da linguagem não-verbal em sala de aula.28 É necessário que nos cursos de formação sejam apresentadas estratégias evidenciando a possibilidade do ensino de determinados tópicos com diversos modos.17

 

REPRESENTAÇÃO COM MULTIMODOS

Modo verbal

O modo verbal refere-se à descrição das entidades e das relações entre elas por meio de palavras, que podem ser faladas ou escritas. Apesar de parecerem comuns e familiares, as palavras, por si só, são símbolos, o que ressalta a importância e o cuidado necessários ao trabalhar com esse modo.

O modo verbal, em sala de aula, é predominante oral (quase sempre presente) e escrita (quadro ou projeção)17 e interage com outros modos.14 A maioria dos processos é expressa por meio da fala16 e as designações verbais possuem ambiguidade.3

O modo verbal, na sua forma oral, conta com recursos de entonação, de repetição e de ênfase e tem uma vantagem sobre a forma escrita, pois permite interação imediata, ajustes de discurso e esclarecimentos em tempo real. Porém, o discurso oral é efêmero e depende da memória do estudante, diferentemente do modo escrito, que favorece revisões e reflexões posteriores.

O diálogo oral com os estudantes atua como mediador dos demais modos, favorece a produção de novos significados, a verificação e a regulação do encaminhamento dos pensamentos dos aprendizes.29 Os alunos indicaram que consideraram as explicações do professor muito importantes para apoiar sua capacidade de entender o uso de equações e sua interpretação, ou tradução, entre as representações nos tópicos estudados.30

O modo verbal, na sua forma escrita, abrange o texto escrito, como livros didáticos, artigos e anotações de aula (quadro e caderno) e material de texto disponibilizado em ambientes virtuais. O material fica acessível para consultas posteriores, sendo útil para a reflexão e revisitação de ideias, mas exige planejamento, clareza e precisão, para compensar a falta de interação imediata.

O tamanho, o tipo e a cor das letras selecionadas, a distribuição das letras no espaço, o desenho da letra (escrita manuscrita ou letra impressa), além da altura e largura da letra, dão um sentido complementar à forma escrita.14

Modo simbólico

O modo simbólico na química refere-se ao uso de representações abstratas para descrever e comunicar conceitos químicos de forma compacta. Exige habilidades de interpretação dos aprendizes. A seguir, o Quadro 2 apresenta os principais tipos de representações simbólicas usados na química.

 

 

A linguagem simbólica atua como um recurso que facilita a comunicação entre especialistas, mas pode dificultar a comunicação eficaz com alunos iniciantes.3 O simbolismo químico explora recursos gramaticais complexos para produzir conhecimento e as convenções representacionais precisam ser aprendidas sistematicamente.13

Nas fórmulas moleculares, os símbolos possuem a mesma função gramatical. Já nas fórmulas estruturais, a disposição bidimensional dos símbolos indica maior complexidade. As equações químicas, por sua vez, apresentam uma gramática ainda mais complexa, com diferentes níveis hierárquicos. Assim, à medida que os alunos avançam das fórmulas moleculares para as estruturais e, finalmente, para as equações químicas, as demandas semânticas aumentam significativamente. Em uma equação química, o coeficiente numérico permite que equações químicas descrevam as relações quantitativas de uma reação no nível submicroscópico (o nível da molécula) e a propriedade qualitativa dada pelo símbolo de estado físico permite a construção de reações químicas no nível macroscópico (o mundo material que pode ser sentido),1 o que contribui para aumentar as demandas semântica (interpretação do conteúdo químico) e semiótica (interpretação dos signos e símbolos).

Modo visual

O modo visual na química envolve representações gráficas e imagens que ajudam a ilustrar conceitos complexos de forma mais intuitiva e acessível. Complementa o modo verbal, facilita conexões entre diferentes representações, favorece a compreensão e desperta a atenção do observador. A seguir, o Quadro 3 apresenta os principais tipos de representação visual usados na química.

 

 

O potencial de comunicação de uma representação visual é ampliado pela combinação de cores, uso de tons claros e escuros, sombra e luz, alto e baixo relevo, além da escolha de tipografia, iconografia e arranjo.14

As figuras e imagens vão além de meras ilustrações, pois o componente visual-espacial é essencial no pensamento químico.31 Imagens transmitem significados instantâneos32 e, ao retratar objetos reais, aumentam o engajamento e a compreensão.33 A combinação de imagens naturalísticas e abstratas facilita a transição do realismo para a abstração no ensino de ciências. As fotografias capturam a realidade, os desenhos preservam formas com certa abstração.34

Os gráficos tornam padrões, tendências e relações mais evidentes, o que permite que padrões sejam reconhecidos visualmente antes mesmo de análises mais profundas.18 É importante visualizar um gráfico como um processo, para que os alunos estabeleçam conexões com fenômenos dinâmicos.35 Gráficos e tabelas representam mudanças e características de fenômenos de forma abstrata e o alto grau de abstração dos gráficos, em livros didáticos escolares, pode criar dificuldades para os alunos ao tentar interpretá-los.34

Os diagramas mostram relações conceituais com códigos visuais e verbais. Podem comunicar ideias complexas, são bastante abstratos e é necessário o conhecimento de convenções e notações específicas para entendê-los.34

As animações acrescentam significado ao integrar a dimensão temporal às imagens.32 No entanto, os estudantes enfrentam dificuldades em conectar as animações com gráficos e equações, pois tendem a focar em aspectos superficiais e ignoram a dinâmica química envolvida.36

A simulação pode oferecer experiências de aprendizagem experiencialmente realistas, pois fornece aos alunos oportunidades de visualizar ou interagir com o fenômeno que está sendo explorado.37 As ferramentas digitais devem complementar, não complicar, o processo de aprendizagem e devem ser usadas de uma maneira que melhore a compreensão dos alunos sobre conceitos químicos em todos os níveis de representação.25 O uso do recurso visual pode ser complementado com outros modos, como o modo concreto (experimentos e modelos bola-vareta).38 Os educadores podem considerar usar simulações como um suplemento para atividades práticas em vez de uma substituição.39

Modo concreto

O modo concreto envolve o uso de objetos físicos e experiências práticas, permitindo a manipulação direta de materiais para explorar, investigar e construir conhecimento. A seguir, o Quadro 4 apresenta os principais recursos do modo concreto usados na química.

 

 

A manipulação favorece o refinamento cognitivo porque a prática e o manuseio possibilitam ajustes na compreensão.18 A argumentação científica é um processo que começa com a investigação material (uma experiência de ver ou tocar algo por si mesmo).40

Vários estudos abordaram o papel dos laboratórios de práticas. As atividades de laboratório permitem a aprendizagem de conceitos, processos, habilidades, fatos e atitudes.41 Um conjunto mínimo de expectativas para considerar ambientes de ensino e aprendizagem de laboratório inclui acessibilidade, alinhamento de objetivos, preparação dos alunos, diálogo, segurança, interdisciplinaridade, criatividade, avaliação diversificada e uso do feedback para aprimoramento contínuo da aprendizagem.42 O número de modos de representação usados nas aulas de laboratório é maior do que nas aulas normais de ciências, envolvendo diagramas de configuração, táteis, aparelhos, gestos e fala.15

A manipulação de materiais em sala de aula enriquece a discussão e promove a participação dos estudantes.43 Em pesquisa realizada, observou-se que a coleta e análise de amostras de solo do ambiente escolar aumentou o interesse por ciências, desenvolveu habilidades investigativas e de trabalho em equipe, além de aprofundar a compreensão sobre a ciência do solo.44

Os jogos educacionais ajudam no desenvolvimento de habilidades cognitivas, na aplicação de regras e na resolução de problemas, além de promover a interação em grupo e o aprendizado em diferentes domínios.45 O uso de jogos de tabuleiro no ensino aumenta a motivação dos alunos, facilita a compreensão de conceitos complexos e melhora a eficiência da aprendizagem.46

A construção de modelos físicos a partir de massa de modelagem ajuda a revelar detalhes nas interpretações dos alunos que, de outra forma, seriam difíceis de identificar, ampliando as possibilidades de categorização e variação das representações.47

Modo gestual

O modo gestual envolve o uso de movimentos corporais para representar conceitos químicos, facilitar a comunicação e reforçar a compreensão de fenômenos abstratos. O Quadro 5 apresenta os principais recursos do modo gestual utilizados no ensino de química.

 

 

O gesto como modo de representação é subvalorizado na ciência, sendo comumente considerado como significativo apenas nas artes.48 A habilidade de resolver problemas ou criar produtos usando o corpo inteiro ou partes do corpo é de particular importância para os químicos, assim como para os dançarinos, atletas, cirurgiões e artesãos.31 Até um gesto de apontar, que parece ser simples e rotineiro, tem uma função fundamental em sala de aula para determinar claramente ao que a professora está se referindo.17 Respostas verbais e gestuais dos alunos são mais precisas do que avaliações escritas. A abordagem multimodal nas avaliações deve ser considerada pelos educadores.49

Formas de aprendizagem em ambientes científicos utilizando o corpo incluem uma variedade de conceituações, desde dramatizações até interações e manipulações de objetos físicos e pensamento multimodal que envolve gestos, expressões faciais e orientações corporais, posições e movimentos.50 O drama criativo pode contribuir para a aprendizagem conceitual de ciências por alunos mais jovens.2

A realidade mista amplia a aprendizagem incorporada, permitindo que os alunos explorem e manipulem conceitos de forma interativa. A combinação de tecnologias digitais com interações físicas deve promover a troca de ideias e a interação entre os alunos, evitando o uso superficial da tecnologia.51

Condições complementares

No ensino de química, o uso de múltiplos modos de representação não ocorre de forma isolada, mas é influenciado por diversas condições complementares como a proxêmica, o suporte para a escrita, o espaço de ensino e o ritmo de apresentação, que podem potencializar ou dificultar sua eficácia.

A proxêmica, portanto, está relacionada à maneira como um indivíduo se organiza, ocupa e utiliza o espaço no qual está envolvido.22 O suporte para a escrita envolve o quadro tradicional, que permite intervenções imediatas do professor, ou a projeção digital, que amplia as possibilidades didáticas ao incorporar o modo visual (animações, simulações, vídeos). O espaço de ensino, ao ser planejado de forma adequada, pode criar condições que favoreçam a interação entre os diferentes modos de representação, como o verbal, visual, simbólico e gestual, tornando as abordagens de ensino mais acessíveis e eficazes. O ritmo de apresentação desempenha um papel crucial, pois uma transição muito rápida ou desconectada entre diferentes modos pode dificultar a construção do conhecimento pelos alunos.

 

METODOLOGIA

A pesquisa foi realizada durante um workshop sobre o uso de representações com multimodos no ensino de química, conduzido na Faculdade de Ciências da Universidade do Porto, em Portugal. Participaram nove estudantes do Mestrado em Ensino de Física e de Química no 3º Ciclo do Ensino Básico e no Ensino Secundário - curso que habilita professores a lecionarem nos anos finais do ensino fundamental e no ensino médio, respectivamente.

No início do workshop, os participantes responderam a um questionário (Material Suplementar) para registrar suas concepções e experiências prévias, autorizando o uso anônimo das respostas para pesquisa. Depois, houve uma intervenção da equipe de investigação (tratamento), onde se abordou o triângulo de Johnstone, a multirrepresentação, a diferença para representação com multimodos, os modos segundo Gilbert, a avaliação com multimodos e um momento para discussão. Posteriormente, na atividade proposta (Material Suplementar), os participantes sugeriram representações multimodais para um conceito químico apresentado verbalmente, permitindo avaliar a ressignificação do uso dos multimodos.

A atividade poderia ser realizada individualmente ou em duplas e cada participante recebeu uma folha com vários textos (modo verbal escrito) abordando diferentes tópicos: transição eletrônica, ação limpante do detergente, massa atômica, reações nucleares, pressão de vapor, coeficiente de solubilidade, equilíbrio químico, hibridização de orbitais do carbono, hidrocarbonetos e carbono assimétrico. O desafio seria expressar a mesma ideia do texto em um outro modo de representação, à escolha.

Os dados quantitativos do questionário e do material elaborado na atividade foram analisados estatisticamente para descrever tendências na amostra. Os dados qualitativos do questionário e da atividade foram analisados segundo a abordagem da análise temática.

A análise temática buscou identificar e interpretar temas centrais em um conjunto de dados a partir da identificação de temas recorrentes e sua relação com a pesquisa. Procedeu-se à identificação de padrões, agrupamento por temas e interpretação dentro de um referencial teórico a partir da abordagem de seis etapas:52 familiarização com os dados, geração dos códigos iniciais, busca por temas, revisão dos temas, definição e nomeação dos temas, produção do relatório. Um tema captura um aspecto importante dos dados, relevante para a questão da pesquisa, independentemente da frequência com que ocorre dentro dos dados.53 No contexto da investigação, a pergunta geradora foi: "Quais são os temas centrais que emergem das respostas e manifestações dos participantes sobre representações com multimodos no ensino da química?". O trabalho utilizou um método dedutivo, pois os temas identificados na revisão da literatura foram usados como base para as perguntas do questionário e para a codificação dos dados.54 Assim, os temas foram orientados por categorias analíticas definidas com base na literatura, com abertura para identificar variações ou subtemas que estivessem alinhados aos eixos teóricos principais.

 

RESULTADOS E DISCUSSÃO

A despeito da amostra reduzida, os resultados obtidos apontam para tendências e desafios recorrentes na formação docente inicial. Portanto, é possível antever implicações práticas que podem orientar futuras propostas de formação, com foco no desenvolvimento de competências multimodais para o ensino de Química.

Em relação à pergunta 01 ("Teve ou tem experiência como professor de Química?"), quatro participantes responderam que não apresentavam experiência de ensino e os demais responderam ter alguma experiência (de um a cinco anos de experiência de ensino). Em relação à pergunta 02 ("Nível de ensino em que pretende atuar"), as pretensões de trabalho, após estarem aptos, seriam o ensino superior ou o terceiro ciclo (um respondente cada), o ensino secundário (dois respondentes) e o ensino secundário associada a outra opção (cinco respondentes). No sistema educacional português, o 3º ciclo do Ensino Básico corresponde aproximadamente ao Ensino Fundamental II (6º ao 9º ano) no Brasil, enquanto o Ensino Secundário equivale ao Ensino Médio. As respostas à pergunta 03 ("O que você entende por representações multimodais?") e as respectivas frequências e percentuais são apresentadas na Tabela 1.

 

 

Os resultados apontam diferentes níveis de compreensão entre os respondentes. Alguns dos participantes entendem que as representações de diferentes fórmulas são suficientes para caracterizar as representações com multimodos. Isto sugere uma percepção mais restrita, que considera apenas as transformações intra-modo, ou seja, uma transcrição de uma representação para outro sistema semiótico, mas ainda dentro do mesmo registro.12 Cinco respondentes optaram pela alternativa que apresenta diferentes modos de representação, evidenciando uma noção alinhada com a definição aceita de multimodalidade7,14,15 e sugerem um nível de entendimento maior sobre o uso de diferentes modos no ensino de química. Um participante declarou não saber exatamente o que são representações multimodais, o que reforça a relevância da intervenção formativa proposta.

As respostas à pergunta 04 ("Qual das opções abaixo não representa o uso de multimodos no ensino de Química?") e as respectivas frequências e percentuais são apresentadas na Tabela 2. A opção "O professor representa uma substância através de suas fórmulas molecular, estrutural e espacial", impõe uma restrição de representações dentro do mesmo modo (o simbólico), mesmo que com graus variados de abstração e com diferentes demandas semânticas. Apenas dois participantes corretamente assinalaram essa opção que indica submodos ou formas específicas de um mesmo modo.48 Os demais respondentes optaram por outras alternativas, o que indica uma compreensão equivocada por parte da maior parte dos participantes. Embora a noção geral de multimodalidade esteja presente, ainda existe confusão entre o uso de diferentes modos e a variação de formas dentro de um mesmo modo.1,7,12,14 Essa distinção é importante para a compreensão e aplicação didática da multimodalidade.

 

 

Indagados, na pergunta 05 ("Você se recorda do uso, pelos seus professores, de representações multimodais em aulas de Química?"), se recordavam de experiências com representações multimodais, apenas um respondeu com alguma frequência e os demais que raramente (cinco) ou que não se lembravam desse uso (três). As respostas à pergunta 06 ("Assinale aquela(s) alternativas que você concorda") e as respectivas frequências são apresentadas na Figura 3.

 

 

Três participantes selecionaram afirmações que refletem concepções equivocadas. A multimodalidade não está associada apenas às mídias e tecnologia digital8 - o que reduz o trabalho com multimodos ao uso de recursos digitais e simplifica as explicações entre as diferenças entre estudantes com diferentes suportes tecnológicos. A opção "As representações multimodais são eficazes para todos os alunos da mesma maneira" desconsidera as diferenças individuais na aprendizagem e a necessidade de adaptação dos recursos a diferentes perfis de estudantes.

Quando solicitados, na pergunta 07 ("Poderia compartilhar um exemplo de como você incorpora, ou poderia incorporar, representações multimodais em uma lição de Química?"), os participantes forneceram exemplo de como representações multimodais poderiam ser incorporadas em uma lição de química: cinco participantes forneceram exemplos que envolviam tópicos (ligação química, equilíbrio químico, gases ideais), métodos de ensino (Exposição e promoção de discussões) e modos específicos (simulações, modelos 3D, vídeos, webquests, laboratórios virtuais). As respostas à pergunta 08 ("Quais tipos de recursos multimodais você considera mais adequado para o uso nas aulas de Química?") e as respectivas frequências são apresentadas na Figura 4. A ênfase ao modo visual (infográficos, vídeos e simulações) reforçam a importância da fluência visual dentro das práticas especializadas em química.10

 

 

Em relação à pergunta 09 ("Quais são os maiores desafios ao incorporar representações multimodais no ensino de Química?"), a opção "Falta de conhecimento sobre o assunto" foi assinalada sete vezes, as opções "Dificuldade técnica" e "Acesso limitado a recursos" foram assinaladas cinco vezes cada e as opções "Falta de tempo, durante a aula" e "Falta de tempo para a preparação da aula" foram assinaladas quatro vezes cada.

Na pergunta 10 ("Se você já utilizou representações multimodais em suas aulas, quais foram os benefícios que você observou?"), os benefícios do uso de representações multimodais escolhidas pelos participantes foram maior engajamento dos alunos (5 participantes), facilitação do entendimento de conceitos complexos e melhoria na retenção de conteúdo (4 participantes) e melhora na nota da prova e das atividades em sala (um participante).

Em relação às perguntas abertas 11 ("Você tem alguma sugestão para melhorar o uso de representações multimodais no ensino de Química?"), 12 ("Existe alguma área específica, no uso de representações multimodais, em que você gostaria de receber mais suporte ou recursos?") e 13 ("Há mais alguma informação ou comentário que você gostaria de compartilhar sobre o tema?"), os participantes não responderam ou disseram não estar à vontade para responder. A falta de respostas dos participantes pode estar ligada à dificuldade das perguntas abertas, que exigem maior elaboração. A insegurança em sugerir algo decorre da falta de conhecimento sobre o tema e da inexperiência no ensino, destacando a necessidade de capacitação e exemplos práticos.

A partir da análise das perguntas e das respostas do questionário, a partir de uma abordagem semântica,52 emergiram dois temas principais que estruturaram o conhecimento, a percepção e os desafios do uso das representações multimodais no ensino de química a partir das perspectivas dos participantes. Esses temas não apenas agruparam as perguntas, mas revelaram as questões centrais que orientaram a investigação. Cada tema abrangeu dois subtemas (Figura 5). As expressões usadas para evidenciar os temas e subtemas são ilustrativas, e nenhum deles surgiu de um único dado isolado.53

 

 

Na dimensão pessoal, o perfil dos participantes revelou pouca experiência em ensino e o desejo de trabalhar com estudantes iniciantes em Química. Eles lembravam pouco ou nada do uso de multimodos por seus professores, indicando que essa abordagem não foi enfatizada em sua formação. O ensino tradicional, focado em explicações verbais e representações simbólicas, sem a integração de diferentes modos, pode ter contribuído para essa falta de percepção.

Na dimensão pessoal, as experiências e crenças dos participantes mostraram que alguns reconhecem a aplicabilidade das representações multimodais na Química e seu potencial em metodologias interativas. Há uma ênfase no uso de tecnologias digitais, o que sugere uma visão de dependência da tecnologia. A menção, por vários participantes, ao modo visual está em consonância com o que a literatura aponta quanto à relevância da fluência visual para a aprendizagem da Química, especialmente no que se refere à interpretação e à integração de representações.10 Ressalta-se a menção ao uso de podcasts, uma forma recente de mídia e uma renovação do modo verbal, promovendo acessibilidade e aprofundamento. A sugestão de atividade pedagógica colaborativa (APC) reflete uma abordagem dialógica e inclusiva. A resposta escolhida por todos os participantes que relataram ter alguma experiência de ensino, "maior engajamento dos alunos", ressalta uma potencialidade do uso dos multimodos, que é despertar o interesse dos estudantes.46,51 Talvez isto se dê por tornar as aulas mais dinâmicas e atrativas, mas também pela possibilidade de aumentar o entendimento daqueles pontos mais abstratos. Quando o aluno compreende melhor o conteúdo, ele se sente mais motivado a continuar aprendendo, criando um ciclo positivo de interesse44 e aprofundamento na química.

Na dimensão conceitual, no subtema compreensão e concepções, observou-se que a formação sobre representações multimodais apresentou fragilidades, com muitos participantes confundindo os termos multirrepresentações e multimodalidade. Muitos viram a multimodalidade como variações dentro de um mesmo modo, ao invés de uma diversidade de modos. No geral, a análise das respostas sugere uma necessidade de abordagem mais cuidadosa e com mais esclarecimentos para que os futuros professores tenham uma visão mais consistente do assunto. Os professores devem estar atentos ao uso de diferentes modos no ensino e também promover essa consciência entre os alunos.16 Na dimensão conceitual, no subtema projeções, os resultados apontam para os desafios de preparação insuficiente para trabalhar com multimodos e a questão de como gerir o tempo, tanto de preparação para a aula quanto da própria aula, destacando a necessidade de repensar a formação docente. Isso inclui integrar o ensino de multimodos ao longo do curso e enriquecer os livros didáticos com mais exemplos e sugestões de atividades multimodais. Estratégias mais acessíveis e de fácil implementação poderiam reduzir a sobrecarga de tempo e facilitar a adoção dessas abordagens. A capacitação do docente, tanto inicial quanto continuada, pode ser uma boa iniciativa no sentido de aprofundar a formação específica sobre o uso de representações multimodais no ensino de química.

Em relação à atividade proposta, os tópicos abordados pelos participantes, as estratégias adotadas e os detalhes relevantes de cada proposta estão sintetizados no Quadro 6.

 

 

Dos dez tópicos oferecidos, observou-se que seis assuntos diferentes foram abordados pelos participantes, sendo que o assunto de transição eletrônica foi o mais presente nas produções (cinco vezes), talvez por ser um assunto inicial nos estudos da química, ou por ser um conteúdo que sempre desperta curiosidade nos estudantes (teste da chama, cores dos fogos de artifícios) ou também por ser o primeiro dos tópicos apresentados na lista. Com o tempo escasso, os participantes podem ter optado por trabalhar logo no primeiro conteúdo que lhes foi oferecido.

Dentre os modos propostos para se trabalhar os tópicos, o visual (seis vezes) e o concreto (cinco vezes) foram os mais lembrados, seguidos do simbólico (três vezes), verbal e gestual (duas vezes cada). Os participantes, baseados no exemplo apresentado, usaram texto ou combinaram texto com modos simbólico e visual para apresentar como trabalhar o tópico escolhido com os alunos. Enquanto algumas respostas foram resumidas, outras estruturaram bem a ideia central, e uma delas até detalhou um roteiro para uma aula de 50 min.

As propostas dos participantes foram analisadas por meio da abordagem de análise temática, visando identificar como as produções se alinharam aos temas e subtemas levantados nas respostas pré-intervenção.

Na dimensão pessoal, as respostas dos participantes surpreenderam em relação ao subtema do perfil detalhado anteriormente. Apesar da pouca experiência de ensino e de não terem retido tantas memórias de uso de multimodos, apresentaram um repertório variado de modos para trabalhar diferentes tópicos. Em relação ao subtema experiências e crenças observou-se uma mudança entre o pré e o pós-intervenção. Se antes ressaltou-se, nas respostas, uma ênfase no modo visual e vinculado às tecnologias digitais, indicando uma preferência por recursos multimodais digitais, após a intervenção, outros modos de representação também ganharam protagonismo, como o concreto, o simbólico e o gestual, sinalizando uma mudança na forma como eles entenderam ou vislumbraram possibilidades de incorporar as representações multimodais no ensino de química. O fato de seis tópicos diferentes da química terem sido abordados reforçou, conforme já salientado, que os participantes têm uma boa noção da aplicabilidade das representações multimodais em diferentes áreas da química. A preocupação em utilizar mais de um modo reforça a visão inicial dos participantes de que essa prática pode resultar em aumento da motivação dos alunos e despertar o interesse dos estudantes.

Na dimensão conceitual, no subtema compreensão e concepções, a produção dos participantes sinalizou uma maior demarcação em relação aos termos de multirrepresentação e multimodalidade. Os exemplos dados foram todos com variação de modos. No subtema projeções, as propostas dos participantes apontaram para uma melhor preparação para trabalhar com multimodos, encorajando-os a diversificarem o repertório de modos utilizados e enxergando possibilidades até então não vislumbradas.

Destaca-se o fato da atividade proposta envolver uma questão aberta, e, neste caso, os participantes já demonstraram maior desprendimento e desenvoltura para responder, sinalizando uma maior segurança em relação ao uso das representações com multimodos no ensino de química.

 

CONCLUSÕES

Estamos conscientes do número reduzido da nossa amostra e de alguma fragilidade conclusiva principalmente na parte quantitativa do nosso estudo. Os resultados exploratórios a que chegamos, porém, permitem algumas conclusões interessantes e promissoras.

A análise temática foi escolhida porque permite flexibilidade e fornece um relato rico e detalhado dos dados.53 Os resultados do questionário pré-intervenção indicaram que, embora os participantes reconhecessem o potencial das representações multimodais no ensino de química, existiam lacunas significativas tanto em sua compreensão conceitual quanto em sua preparação prática para utilizá-las de forma eficaz. Na dimensão pessoal, destacou-se a pouca experiência de ensino, a falta de vivência com multimodos e a tendência de associar multimodalidade exclusivamente à tecnologia digital. Na dimensão conceitual, muitos confundiram multirrepresentações com multimodalidade e alguns acreditavam que sua aplicação teria a mesma eficácia para todos os estudantes.

A atividade prática após a intervenção revelou uma mudança na compreensão e uso das representações multimodais pelos participantes. Houve maior engajamento e disposição para integrar diferentes modos de representação, como o concreto, simbólico e gestual, no planejamento pedagógico. Além disso, surgiram sugestões para aplicar multimodos em várias áreas da Química, refletindo uma crescente preocupação com a diversificação das estratégias didáticas.

No entanto, persistem desafios importantes. A falta de conhecimento sobre multimodalidade, dificuldades técnicas e limitações de tempo demonstram a necessidade de uma formação docente mais aprofundada, que inclua, de forma sistemática e contínua, o uso de multimodos como estratégia pedagógica. Para suprir essas lacunas, estratégias como workshops, cursos específicos e maior inserção de atividades multimodais nos materiais didáticos podem ser eficazes.

Um aspecto não abordado neste estudo, mas relevante para futuras pesquisas, é o uso de multimodos na avaliação. Embora a multimodalidade seja discutida como ferramenta de ensino, os estudantes frequentemente são limitados a um único modo de expressão (verbal escrito) na avaliação. A escrita tem sido, tradicionalmente, o modo privilegiado nas escolas para avaliar e reconhecer a aprendizagem dos alunos.16 Explorar avaliações que integrem diferentes modos representacionais pode ser essencial para incorporar a multimodalidade nos processos de ensino e aprendizagem. O uso combinado de múltiplos modos permite ao avaliador captar melhor a compreensão do aluno, tornando a avaliação mais rica e significativa.49

Por fim, é importante ressaltar que a intervenção realizada foi pontual. Para que a multimodalidade seja realmente incorporada à prática docente, é fundamental que os futuros docentes vivenciem o uso dos multimodos em contextos reais de ensino ao longo de toda sua formação.

 

MATERIAL SUPLEMENTAR

No material suplementar encontra-se o questionário utilizado para coleta de dados nesta pesquisa e o material destinado à atividade pós-intervenção. Está disponível em http://quimicanova.sbq.org.br, em arquivo pdf, com acesso livre.

 

DECLARAÇÃO DE DISPONIBILIDADE DE DADOS

Todos os dados discutidos neste estudo estão disponíveis no próprio texto e no material suplementar associado.

 

AGRADECIMENTOS

Aos estudantes participantes da pesquisa. O trabalho foi financiado por Fundos Nacionais através da FCT - Fundação para a Ciência e a Tecnologia, I. P., no âmbito dos projetos UID/00081/2025 (CIQUP) e LA/P/0056/2020 (IMS - Instituto de Ciências Moleculares).

 

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